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Tensão em Brasília diante da bomba-relógio Eduardo Cunha


Michel Temer não seria presidente sem o impeachment arquitetado por Eduardo Cunha, mas se o antes poderoso deputado conservador, detido na quarta-feira pela Lava Jato, decidir revelar o que sabe sobre os labirintos da corrupção no Brasil, poderá se converter numa bomba para Brasília.

"Cunha tem um potencial destrutivo muito grande", explica à AFP Alberto Almeida, diretor do Instituto Análise.

O ex-presidente da Câmara dos Deputados, um político experiente muitas vezes comparado ao personagem Frank Underwood, da série "House of Cards", caiu nas redes do juiz Sérgio Moro, que investiga o Petrolão, e a possibilidade de negociar uma redução de pena através da delação premiada causa suores frios nos corredores do poder.

"Quem em Brasília estaria imune a uma delação premiada de Cunha?", questiona o professor de Direito Ivar Hartmann, da Fundação Getúlio Vargas (FGV, Rio), ao recordar que a Lava Jato conseguiu colocar na prisão empreiteiros e políticos importantes de vários partidos e que também tem em sua mira o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

Três ministros de Temer já tiveram de renunciar por envolvimentos em escândalos com apenas um mês do novo governo.

Um deles, Romero Jucá, apresentou sua demissão como ministro do Planejamento depois de ter sido divulgada uma gravação na qual aparece afirmando que a destituída presidente Dilma Rousseff devia cair para "frear a sangria" causada pelas investigações da Petrobras.

A prisão de Cunha era esperada, mas vê-lo se transformar num delator, com seu profundo conhecimento interno do poder, não foi uma boa notícia para Temer, que foi surpreendido pela notícia durante sua visita ao Japão, embora o Planalto tenha negado versões de que ele teria encurtado a viagem por causa disso.

"Não duvido que, se Cunha tiver de escolher entre preservar a reputação de seu partido ou salvar sua pele, vai escolher salvar a própria pele", opina Hartmann.

- Blindando Temer -
De fato, em setembro, depois de ser destituído por uma arrasadora maioria, Cunha, desafiador, anunciou que escreverá um livro sobre os pormenores do impeachment e recordou que outros 160 parlamentares têm problemas com a Justiça.

Também disparou contra alguns caciques do Executivo, como o chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha; o secretário de Governo, Geddel Vieira Lima, e o secretário do programa de associações para investimentos, Moreira Franco.

Se Cunha decidir abrir a boca, "a crise pode afetar o núcleo do governo e isso levará a uma instabilidade política inevitável", opina o analista político Marco Antonio Teixeira, da FGV de São Paulo.

E isso em um momento delicado, quando o Brasil atravessa a pior recessão em um século e Temer, que pretende ser o "salvador" da economia, quer reformar a Constituição para levar avante um ajuste fiscal que prevê o congelamento do gasto público por 20 anos.

Apesar de contar com o apoio dos mercados, sua legitimidade é questionada e sua popularidade é de apenas 14%.

A Presidência reagiu com cautela a respeito da prisão de Cunha.

"O governo tem zero preocupação ante uma eventual delação. Não interfere no caso Lava Jato e a prisão de Cunha é uma ação da Justiça, um poder independente", declarou o secretário de Comunicação Social, Márcio Freitas, citado pelo portal de O Globo.

Em Tóquio, Temer também tentou diminuir a tensão, afirmando que "por ora, são apenas alegações" e que se, um dia, adquirirem consistência, "o governo verá o que fazer".

"Mas se, cada vez que se menciona o nome de alguém [na Lava Jato], isso dificultar a ação do governo, haverá dificuldades", admitiu.

Temer, afirma Hartmann, poderá ter de sacrificar outros colaboradores.

Ante a ameaça de Cunha, a reação lógica do governo será blindar Temer, porque perder outro ministro pode ter um custo aceitável, desde que o presidente não caia, conclui o analista.

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Fonte: AFP /Agence France-Presse

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